Carboidrato faz mal para gatos?
A inclusão do carboidrato nos alimentos comerciais é frequentemente questionada por médicos-veterinários e tutores de gatos. A dúvida surge do fato de que gatos são carnívoros estritos e seus ancestrais, os gatos selvagens, consumiam pequenas presas ao longo do dia, constituindo uma dieta rica em proteínas, com quantidades moderadas de gordura e com pouco carboidrato [1,2], enquanto que dietas comerciais utilizadas atualmente na alimentação dos gatos domésticos podem fornecer quantidade variada de carboidrato [3]. Como resultado dessa diferença no perfil nutricional das dietas e do fato de que o carboidrato não é considerado um nutriente essencial para gatos [1,4], a presença dele nas dietas para gatos é frequentemente questionada, além de ser responsabilizado pelo número crescente de gatos com sobrepeso ou obesos.
Os gatos precisam consumir energia para realizar suas atividades diárias, e esta pode ser obtida através das fontes de proteína, gordura e carboidratos contidas no alimento. O carboidrato presente nos alimentos fornece energia para os gatos na forma de glicose, sendo esta uma fonte de energia primária para a maioria das células do organismo [5].
Apesar dos gatos metabolizarem os carboidratos diferentemente de outras espécies, gatos saudáveis podem digerir e metabolizar os carboidratos advindos da dieta, desde que passem por processamento adequado [1,6]. A ausência da amilase salivar e a atividade moderada da amilase pancreática nos gatos, quando comparada a outras espécies, não são fatores impeditivos para a digestão e utilização dos carboidratos advindos da dieta [7-9]. Estudos indicam que o aproveitamento desse nutriente pelos gatos está entre 94 a 100%, diante do consumo de dietas comerciais adequadamente processadas [1,6,9].
Além disso, as fontes de carboidratos como grãos, tubérculos e legumes, entre outros ingredientes, possuem em sua constituição o amido, e este último é incluído nas formulações dos felinos para colaborar no adequado processamento das rações, conferindo formato, textura e sabor aos alimentos comerciais, principalmente nas rações secas [3,10,11].
Atualmente, não há evidências científicas que comprovem que carboidratos possam causar algum malefício a gatos saudáveis [1]. Estudos demonstram que a pouca atividade física, o sedentarismo, a castração e, principalmente, o consumo excessivo de calorias, devido ao consumo de alimento com alta energia ou pela quantidade excessiva de alimento, são os fatores relacionados ao desenvolvimento da obesidade e das doenças relacionadas à obesidade [1,12].
Portanto, os gatos saudáveis podem sim receber em sua dieta quantidades moderadas de carboidrato, pois são capazes de utilizar a energia advinda desse nutriente quando adequadamente processado. O importante, é sempre buscar a orientação de um médico-veterinário ou zootecnista para a escolha do alimento e quantidade a ser oferecida, evitando assim, excessos na alimentação e diminuindo o risco da obesidade.
Referências
1. FEDIAF Scientific Advisory Board Carbohydrate Expert Review l Publication September 2019.
2. Plantinga, E. A.; Bosch, G.; Hendriks, W. H. Estimation of the dietary nutrient profile of free-roaming feral cats: possible implications for nutrition of domestic cats. British Journal of Nutrition 2011, 106, S35–S48.
3. Villaverde, C.; Fascetti, A.J. Macronutrients in feline health. Vet. Clin. N. Am. Small Anim. Pract. 2014, 44, 699–717.
4. National Research Council (NRC). Nutrient Requirements of Dogs and Cats. Washington: National Academies Press. 2006:145-192.
5. Verbrugghe A, Hesta M, Daminet S, et al. Nutritional modulation of insulin resistance in the true carnivorous cat: a review. Crit Rev Food Sci Nutr 2012; 52: 172–82.
6. De-Oliveira LD, Carciofi AC, Oliveira MC, Vasconcellos RS, Bazolli RS, Pereira GT, Prada F. Effects of six carbohydrate sources on diet digestibility and postprandial glucose and insulin responses in cats. Journal of Animal Science. 2008 Sep 1;86(9):2237-46.
7. McGeachin RL, Akin JR. Amylase levels in the tissues and body fluids of the domestic cat (Felis catus). Comp Biochem Physiol B 1979; 63:437–9.
8. Morris JG, Trudell J, Pencovic T. Carbohydrate digestion by the domestic cat (Felis catus). British journal of nutrition. 1977 May;37(3):365-73.
9. Kienzle E. Carbohydrate metabolism of the cat 1. Activity af amylase in the gastrointestinal tract of the cat. J Anim Physiol Anim Nutr 1993; 69:92–101.
10. Crane, S.W.; Cowell, C.S.; Stout, N.P.; Moser, E.A.; Millican, J.; Romano, P.J.; Crane, S.E. Commercial pet foods. In Small Animal Clinical Nutrition, 5th ed.; Hand, M.S., Thatcher, C.D., Remillard, R.L., Roudebush, P., Novotny, B.J., Eds.; Mark Morris Institute: Topeka, KS, USA, 2014; pp. 157–190.
11. Van Boekel, M.; Fogliano, V.; Pellegrini, N.; Stanton, C.; Scholz, G.; Lalljie, S.; Somoza, V.; Knorr, D.; Jasti, P.R.; Eisenbrand, G. A review on the beneficial aspects of food processing. Mol. Nutr. Food Res. 2010, 54, 1215–1247.
12. Backus RC, Cave NJ, Keisler DH. Gonadectomy and high dietary fat but not high dietary carbohydrate induce gains in body weight and fat of domestic cats. British Journal of Nutrition. 2007 Sep;98(3):641-50.